domingo, 8 de fevereiro de 2015

Por quê você não pode falar com os mortos

A minha tia era uma vigarista e ela aprendeu com o melhor - o pai dela. O meu avô nunca fez algo muito grande, porém ele viveu trapaceando, se mantendo discreto, fora do radar, o que provavelmente fez com que ele nunca fosse pego. Nenhuma vez. Ele se orgulhava muito disso.
Mamãe não entrou no “negócio” da família. Em vez disso ela encontrou uma religião e se casou com um contador. É tão irônico, é como uma piada, porém é verdade; O papai era o melhor em me ajudar com as lições de casa de Matemática. Mamãe cuidou de mim para que eu não tivesse uma infância corrompida, e pudesse seguir um caminho mais interessante na vida.
Tia Cassie era a única pessoa que poderia mexer no caminho da minha vida. Ela era uma psicóloga, o que a fazia um pouco mais respeitável. Mas a tia Cassie usava sua habilidade para “ler” uma pessoa de várias maneiras possíveis, uma, provavelmente não foi esperada pela Universidade que emitiu o seu diploma.
Tia Cassie era uma verdadeira psíquica.
Ela teve uma loja e tudo, vendia cristais, ervas, velas. Tudo que você precisar para preencher o vazio místico da sua vida poderia ser comprado na sua pequena loja. Também havia uma sala privada nos fundos, a qual ela usava para leituras espirituais e sessões espíritas.
Por que ambos os meus pais trabalhavam, eu era deixado na loja da tia Cassie para ajudá-la com os seus pequenos shows. Eu a ajudava com tudo, desde mexer nas luzes, até bater nas paredes. Brincar com o termostato foi ideia minha, e foi uma muito efetiva. Os clientes chegavam a sentir arrepios em suas espinhas não é mesmo? Por quê não oferecer isto?
Cassie me ajudou a me tornar o cético que eu sou hoje. Me mostrou tudo por trás das cenas, truques e etc… Nós assistíamos talk shows com mágicos e médiuns e Cassie me explicava cada passo desde uma simples previsão até como impressionar uma audiência inteira.

Depois de um episódio realmente convincente, eu perguntei para ela se aquilo não poderia ser real? E ela respondeu:
“Os mortos não falam. Qualquer um que afirmar o contrário está fumando maconha até pela bunda.”
Era a convicção dela, mais que tudo, que me fez acreditar nela.
Só houve um cliente que eu já vi a minha tia recusar. Ele era velho, careca e corcunda. Ele tirou o seu chapéu, entrou na loja, e ele torcia o chapéu a medida que ele falava. Cassie ficou tensa imediatamente quando o viu.
O homem disse que trabalhou no sistema penitenciário. Corredor da morte. Ele foi responsável por executar alguns dos maiores criminosos do planeta. Em sua idade avançada, isso o atormentava, devorava sua alma. Ele queria que a Cassie entrasse em contato com as almas daqueles que ele matou, para que ele pudesse se desculpar e implorar por perdão antes de se juntar a eles.

Minha tia ficou em choque. Eu nunca a vi tão nervosa! Ela jogava coisas nele e gritava: “SAIA SAIA SAIA CALA A BOCA SAI FORA!”
Eu me escondi debaixo do balcão com as mãos sobre meus ouvidos até ele ir embora. Depois eu pensei que a reação dela, foi o medo devido a profissão daquele homem. Um executor deve ser o pior pesadelo de um vigarista.
Eventualmente eu descobri isso. Eu queria fazer um show para os meus pais e estupidamente eu tive a brilhante ideia de me passar por um médium, onde eu fingiria falar com o meu avô para a minha mãe, desde que ela sentia muita falta dele. Grande erro. Mamãe enlouqueceu e me proibiu de ver a tia Cassie de novo.
Eu deixei alguns livros na loja, então eu corri para pegá-los enquanto a minha mãe fumava no carro lá fora. Tia Cassie nem precisou perguntar o que havia de errado. Ela podia ver no meu rosto. Eu dei um abraço nela e um adeus enquanto chorava, mas ela me contou um último segredo antes de eu ir.
“Garoto, tem uma maldição nesta família que é passada como uma tocha. Eu espero que os deuses te protejam, e que não seja passado para você quando eu morrer”
Nós não nos falamos novamente por 9 anos. Isso foi quando o Facebook chegou e nenhuma proibição dos pais poderia me evitar de tentar me reconectar com ela. Foi estranho. Ela estava com dificuldades na vida; foi diagnosticada com um transtorno de esquizóide que acabou com os seus negócios.
Para pagar suas contas, ela teve que trabalhar legitimamente e com isso ela foi perdendo todo o seu entusiasmo e paixão pela vida
Um dia eu cheguei em casa e vi uma mensagem esperando na minha inbox, que fez o meu estômago embrulhar.
“Eu te amo garoto. Lembre-se do que eu disse para você.”
Eu disquei o número dela, já chorando. Ninguém atendia. Não parava de ligar de novo e de novo, várias e várias vezes…
Eu estava muito atrapalhado e não consegui contar para a minha mãe. A polícia fez isso por mim no dia seguinte.
Acidente de carro. Motorista bêbado.
O funeral foi um borrão para mim.Eu sentei entre os meus pais na primeira fila e eu estava transtornado, tentando me lembrar do que a minha tia queria que eu me lembrasse.
Nós seguimos o carro fúnebre até o cemitério em silêncio. O padre disse algumas palavras e então eu fui deixado sozinho perto da sua lápide, e eu continuava tentando lembrar.
Eu ouvi trechos da conversa dos meus pais:
“Se Cassie não tivesse sido tão oculta…”
“-Esperando uma pequena participação. É uma vergonha.”
Pequena participação? Aquilo me incomodou. As caixas com coisas do serviços iam até o teto. Eu me virei para dizer algo e eu finalmente entendi.
Atrás dos meus pais haviam várias pessoas, todas paradas encarando o morto a sua frente. Meus pais não estavam dando para eles a menor atenção. O padre murmurou algumas condolências e desculpou-se indo embora pela direita, sem perturbar uma única pessoa.
À frente do grupo, todos olhando exatamente como eu olhei quando vi Cassie pela última vez. Todos os sentimentos e condolências do mundo, não fizeram nenhum bem. A boca dela estava bem aberta, realmente muito aberta e finalmente eu entendi. Eu descobri qual é a maldição da família. Eu sei porque os mortos não falam.
Eles estão muito ocupados gritando.



Tradução Rafa Matos
Bons Pesadelos...