terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Passos


Este texto é longo, peço desculpas por isso. Eu nunca tive que contar essa história nos mínimos detalhes, mas hoje vou fazer isso. É verdade e tudo isso aconteceu quando eu tinha cerca de 6 anos de idade.

Em uma sala com silêncio, se você pressionar as suas orelhas contra o seu travesseiro, você pode ouvir os seus batimentos cardíacos. Quando criança, o som abafado e rítmico, soa como passos no carpete, e como uma criança, quase todas as noites - bem na hora que eu estava prestes a cair no sono - Eu começava a ouvir estes passos e eu gostaria de acordar novamente, pois estava aterrorizado.

Durante a minha infância inteira, eu vivi com a minha mãe em uma vizinhança bem legal, que estava em uma fase de transição - Pessoas de baixa renda estavam se mudando aos poucos para ela, eu e a minha mãe éramos esse tipo de pessoa. Nós vivemos no tipo de casa que você vê sendo transportada em duas partes na interestadual, mas a minha mãe cuidou muito bem dela. Existiam muitas florestas ao redor da vizinhança, o que trazia muitos sons diferentes para que eu pudesse brincar e explorar durante o dia, mas a noite, as coisas se tornavam um pouco mais sinistras para uma criança. Isso, junto com o fato de que, devido a natureza da nossa casa, existia um grande forro que fazia barulhos que preenchiam a minha mente com monstros imaginários e cenários inexplicáveis os quais consumiam meus pensamentos enquanto eu era acordado pelos passos.

Eu disse para a minha mãe sobre os passos e ela disse que eu estava apenas imaginando coisas; Eu persisti o suficiente para que ela colocasse água nos meus ouvidos com um conta gotas, apenas para me acalmar, uma vez que eu acreditei que aquilo iria ajudar. Claro que não ajudou. Apesar de toda a bizarrice e os passos, a única coisas estranha que acontecia, era que de vez em quando, eu acordava na cama de baixo, apesar de ter ido dormir na cama de cima do beliche. Mas isso não era muito estranho, pois as vezes eu acordava para ir ao banheiro ou pegar algo pra beber e poderia esquecer de voltar para a cama de cima e acabar dormindo na de baixo (Eu sou filho único então não importava). Isso acontecia uma ou duas vezes por semana, mas acordar na cama de baixo não era muito assustador. Mas uma noite, eu não acordei na cama de baixo.

Eu ouvi os passos, mas estavam muito longes para me acordar, e quando eu acordei não foi por causa do som de passos ou por um pesadelo, mas porque eu estava gelado. Muito gelado. Quando eu abri os meus olhos, eu vi estrelas. Eu estava na floresta. Eu me sentei imediatamente e estava tentando entender o que estava acontecendo. Eu acho que eu estava sonhando, não parecia provável acordar no meio das florestas.

Tinha uma piscina vazia bem na minha frente - uma daquelas em formato de tubarão. Isso me deu uma sensação tão surreal, mas depois de um tempo, parecia que eu realmente não iria acordar, pois eu não estava dormindo. Eu levantei para me orientar, mas eu não reconhecia esta floresta. Eu brincava nas florestas perto da minha casa o tempo todo, então eu as conhecia muito bem, mas e se não fosse as mesmas florestas, como eu iria sair? Eu dei um passo e senti uma dor inexplicável no meu pé, que acabou me derrubando para onde eu estava sentado há pouco. Eu tinha pisado em um espinho. Pelo brilho da lua, eu pude ver que existiam vários deles por toda parte. Eu olhei o meu outro pé e ele estava bem. Eu não tinha outro arranhão no meu corpo, e nem estava sujo. Eu chorei um pouco e então me levantei.

Eu não sabia para onde ir, então eu só escolhi uma direção e fui em frente. Eu evitei gritar por ajuda, pois não queria ser encontrado por quem, ou o quê poderia estar por aí. Parecia que eu andei por horas.

Eu tentei andar em uma linha reta, e tentei manter o curso, até que eu tive que fazer desvios, mas eu era uma criança e estava com medo. Não tinha uivos ou gritos, e só uma vez eu ouvi um barulho que me assustou. Parecia um bebê chorando. Eu acho que era só um gato, mas eu estava em pânico. Eu corri desviando para diferentes direções, para poder desviar de grandes árvores, galhos grandes e etc.. E eu estava prestando atenção onde eu pisava, pois nesse ponto, meu pé estava em uma péssima forma. Depois de ficar muito tempo andando sem saber para onde os meus passos estavam me levando, pois depois de ouvir o choro, eu vi algo que me preencheu com um tipo de desespero que eu nunca tinha vivenciado antes. Era a piscina em forma de tubarão.

Eu estava a 10 pés de distância de onde eu tinha acordado.
Isso não era magia ou algum tipo de curvatura espacial sobrenatural. Eu estava perdido. Naquele momento eu estava pensando mais sobre sair daquela floresta, do que em como fazer isso. Mas voltar ao começo me causou muito pânico. Eu não estava certo nem de que aquela era a floresta que eu conhecia; Eu tive que rezar para que fosse. Eu corri em um círculo gigante ao redor daquele ponto, ou eu simplesmente virei e andei para trás até chegar ali novamente. Como eu iria sair? Naquele momento a estrela do norte era a estrela mais brilhante, então eu observei e a encontrei, e comecei a segui-la.
Eventualmente as coisas começaram a parecer mais familiares e quando eu vi a “vala” que eu tinha feito com meus amigos, eu sabia que tinha conseguido. Naquele ponto eu estava andando lentamente, pois meu pé estava doendo muito, mas eu estava feliz também por estar tão perto de casa que eu dei uma corrida de leve para chegar mais rápido. Quando eu vi o telhado da minha casa no meio da vizinhança, eu corri mais rápido. Eu só queria voltar para casa. Eu já tinha decidido que eu não iria dizer nada, pois eu não tinha ideia de como explicar o que poderia ter acontecido. Eu virei a esquina e a minha casa apareceu completamente, todas as luzes da casa estavam acesas. Eu sabia que a minha mãe estava acordada, e eu sabia que teria que explicar (ou tentar explicar) por onde eu andei, e eu não fazia ideia por onde começar. Minha corrida foi diminuindo a velocidade e se tornou uma caminhada. Eu vi a sua silhueta através das persianas, e entretanto, eu estava preocupado em como explicar as coisas para ela, que não me importavam muito nesse ponto. Eu dei alguns passos até a porta, e coloquei a minha mão na maçaneta e abri. Bem antes que eu pudesse terminar de abrir, dois braços me agarraram e me puxaram de volta. Eu gritei o mais alto que eu pude: “MÃE! ME AJUDE! POR FAVOR! MÃE!” A sensação de estar tão perto de ficar seguro e então ser puxado fisicamente longe disso, me preencheu com um tipo de pavor, que mesmo depois de todos esses anos, é indescritível.
A porta que eu tinha sido afastado de abrir, abriu, e um flash de esperança surgiu no meu coração. Mas não era a minha mãe.

Era um homem, e ele era enorme. Eu me debatia e consegui chutar a canela da pessoa que estava me segurando, enquanto eu tentava me afastar da pessoa que tinha saído da casa. Eu estava assustado, mas eu estava furioso.. “DEIXE-ME IR! ONDE ELA ESTÁ? ONDE ESTA MINHA MÃE? O QUE VOCÊ FEZ COM ELA!?” A minha garganta doeu por gritar tanto e eu estava pegando ar novamente. Então percebi um som presente que eu não tinha percebido antes. “Querido, se acalme. Eu estou com você.” Parecia com a minha mãe.
Os braços que me prendiam me soltaram, e o homem que tinha saído da casa se aproximou, eu percebi as suas roupas. Ele era um policial. Eu me virei para ver a voz atrás de mim, e vi que realmente era a minha mãe. Tudo estava bem. Eu comecei a chorar, e nós três entramos.
“Eu estou tão feliz que você está em casa querido. Eu estava preocupada de nunca mais te ver.” Nesse ponto ela estava chorando também.
“Me desculpe, eu não sei o que aconteceu. Eu só queria vir para casa. Me desculpe.”
“Está tudo bem, só não faça isso novamente nunca mais. Eu não sei se aguentaria vivenciar isso de novo…”
Uma pequena risada quebrou meus pensamentos e eu sorri um pouco. “Bem, me desculpe por te chutar, mas porque você me agarrou daquele jeito?”!
“Eu só estava com medo de você fugir novamente”
Eu estava confuso. “O que você quer dizer com isso?”
“Nós encontramos o seu recado no seu travesseiro.” Ela disse e apontou para um pedaço de papel que o policial estava segurando do outro lado da mesa.
Eu peguei o recado e o li. Era uma carta de “Estou fugindo”. Dizia que eu era infeliz e nunca mais queria  ver qualquer um dos meus amigos novamente. O policial trocou algumas palavras com a minha mãe, enquanto eu encarava a carta. Eu não me lembrava de escrever ela. Eu não me lembrava de nada disso. Mas até mesmo quando eu ia no banheiro a noite eu não conseguia me lembrar as vezes, mas mesmo que eu tivesse fugido para a floresta por minha conta, mesmo que tudo isso fosse verdade, a única coisa que eu sabia nesse ponto era, “Não é assim que se escreve o meu nome… Eu não escrevi essa carta.”



Bons Pesadelos...